...dia desses, conversando com alguém que não sei quem era, lembrei de algo que nunca mais vi em São Paulo: aquela fumacinha que saía da boca nos dias de frio. Fiz o teste ali mesmo, no corredor, a caminho do estacionamento. Fazia uns 14, 15 graus naquela noite, enchi o bocão de ar e mandei uma bela baforada rumo ao léu – e nada da fumacinha.
Em fração de segundos, elaborei as mais óbvias suposições para justificar o sumiço do fenômeno. Provavelmente, tem a ver com a poluição; ou seria a unidade relativa do ar que mudou? Naturalmente, não tenho cabedal para discorrer nessa seara e minhas elucubrações terminaram, estas sim, como fumaça.
E abriram espaço para a nostalgia. Me vi com sete anos, com um maço de chocolates. Isso mesmo: um maço. A Pan fabricava chocolates em formato de cigarros e, assim, as crianças viajavam no mundo de glamour imaginário em que viviam os adultos fumantes. As mulheres, sempre de vestidos longos, saltos altíssimos, maquiagem impecável e um cigarro à mão – mais para fazer pose que para tragar. Os homens, se não eram destemidos caubóis cavalgando pelos desertos norte-americanos em seus alazões, certamente estariam de smoking (o nome do traje não poderia ser mais propício), ao lado de uma deusa qualquer. As propagandas vendiam essa imagem, de conquistadores, de heróis – todos fumantes.
Eu e meus pares mirins adorávamos aquilo, na verdade mais que o chocolate em si. Pôr a cigarrilha de cacau entre o indicador e o dedo médio, levar o doce à boca e soprar a fumacinha. E a natureza contribuía com generosidade, era denso o efeito daquele vapor. Como era bom ser grande nos dias de frio!
Parei de escrever um pouquinho para me perguntar quando foi a última vez em que vi um chocolatezinho daqueles, em forma de cigarro. Aliás, ainda existe a Pan? Honestamente, não faço a menor idéia. Na prática, tudo isso foi de embrulho, e não só a fumacinha do frio.
Os fumantes não têm mais lugar, que dirá glamour! As propagandas são n vezes mais criativas, porém o encanto foi tragado. Ou vai me dizer que daqui a 30 anos alguém que hoje tem sete vai lembrar de algum ‘reclame’ de televisão? Tomara que eu esteja enganada, mas tenho a impressão que as crianças não curtem juntas, hoje, as pequenas audácias que as de gerações anteriores arriscavam. Quantas perdas, que futuro...
Do nada, o episódio da ausência da fumacinha veio à mente, ontem à noite, diante da pizzaria. Esperávamos o manobrista chegar com o carro. Os termômetros marcavam 14 graus em São Paulo. Esquina da Haddock Lobo com a Alameda Tietê. Fechei os olhos, voltei a cabeça para o alto, enchi o pulmão, soltei a baforada e disparei as retinas: nada. Mas bastou desfocar o olhar daquele primeiro plano, ainda com a cabeça erguida, e lá estavam elas, no contra-luz da lâmpada: milhões e milhões de pequenas gotículas de água, dançando de lado a lado, ao gosto do vento. Além de um inevitável espirro, a danada produziu em mim um sorriso palerma e a descoberta: a garoa não acabou...
Em fração de segundos, elaborei as mais óbvias suposições para justificar o sumiço do fenômeno. Provavelmente, tem a ver com a poluição; ou seria a unidade relativa do ar que mudou? Naturalmente, não tenho cabedal para discorrer nessa seara e minhas elucubrações terminaram, estas sim, como fumaça.
E abriram espaço para a nostalgia. Me vi com sete anos, com um maço de chocolates. Isso mesmo: um maço. A Pan fabricava chocolates em formato de cigarros e, assim, as crianças viajavam no mundo de glamour imaginário em que viviam os adultos fumantes. As mulheres, sempre de vestidos longos, saltos altíssimos, maquiagem impecável e um cigarro à mão – mais para fazer pose que para tragar. Os homens, se não eram destemidos caubóis cavalgando pelos desertos norte-americanos em seus alazões, certamente estariam de smoking (o nome do traje não poderia ser mais propício), ao lado de uma deusa qualquer. As propagandas vendiam essa imagem, de conquistadores, de heróis – todos fumantes.
Eu e meus pares mirins adorávamos aquilo, na verdade mais que o chocolate em si. Pôr a cigarrilha de cacau entre o indicador e o dedo médio, levar o doce à boca e soprar a fumacinha. E a natureza contribuía com generosidade, era denso o efeito daquele vapor. Como era bom ser grande nos dias de frio!
Parei de escrever um pouquinho para me perguntar quando foi a última vez em que vi um chocolatezinho daqueles, em forma de cigarro. Aliás, ainda existe a Pan? Honestamente, não faço a menor idéia. Na prática, tudo isso foi de embrulho, e não só a fumacinha do frio.
Os fumantes não têm mais lugar, que dirá glamour! As propagandas são n vezes mais criativas, porém o encanto foi tragado. Ou vai me dizer que daqui a 30 anos alguém que hoje tem sete vai lembrar de algum ‘reclame’ de televisão? Tomara que eu esteja enganada, mas tenho a impressão que as crianças não curtem juntas, hoje, as pequenas audácias que as de gerações anteriores arriscavam. Quantas perdas, que futuro...
Do nada, o episódio da ausência da fumacinha veio à mente, ontem à noite, diante da pizzaria. Esperávamos o manobrista chegar com o carro. Os termômetros marcavam 14 graus em São Paulo. Esquina da Haddock Lobo com a Alameda Tietê. Fechei os olhos, voltei a cabeça para o alto, enchi o pulmão, soltei a baforada e disparei as retinas: nada. Mas bastou desfocar o olhar daquele primeiro plano, ainda com a cabeça erguida, e lá estavam elas, no contra-luz da lâmpada: milhões e milhões de pequenas gotículas de água, dançando de lado a lado, ao gosto do vento. Além de um inevitável espirro, a danada produziu em mim um sorriso palerma e a descoberta: a garoa não acabou...
6 comentários:
É realmente uma descoberta feliz: ainda temos garoa em São Paulo...
Talvez seja uma forma de compensar a falta de fumacinha e cigarros de chocolate, os únicos (como você bem sabe) que eu aprecio.
Beijos.
Deveria se chamar "essa tal nostalgia".
Não tem mais nada nesse mundo que preste! nem fumacinha, nem cigarrinho da pan.
vc lembra cada coisa.
beijos
Marcela
Também "fumei" daquele cigarrinho, mas o difícil era resistir e não comê-lo! A quem interessar, ele ainda existe... Mudou a embalagem e o nome (o qual não me lembro) e não é em qualquer lugar que vende.
Prometo trazer um pra você assim que encontrar por aí.
Bjo.
A fumacinha hoje não nos sai mais da boca, mas da cabeça de cada ser humano.
O delicioso chocolate Pan que fazia o glamour e o gosto de cada um, hoje é um terrível inimigo da gordura.
À São Paulo restou a garoa, aquela tão necessária para que o tempo não seja tão seco e não nos ardam tanto os olhos de ver esse século XXI tão diferente, mais saudável em saúde ou muito menos em glamour, perdido num tempo que nos faz refletir sobre o futuro.
Futuro certamente difícil e complicado para cada um de nós, pobres humanos que agredimos tanto a natureza e recebemos a cada dia a resposta em forma de furacões e terremotos. Mas, que ao menos para nós dois seja ainda um futuro de paz, cumplicidade e amor.
Beijos, minha amada.
Wan, seu texto me fez lembrar a São Paulo dos anos 70, quando eu andava - mineiroca que sou - perdida por aí na USP...
Me deu uma saudade danada, vontade de rever os pontos que gostava de frequentar com a minha tchurma!!!!
Tudinho por causa da tal fumacinha...hehehe
Como fazia frio no inverno!E como era bom matar o frio com a sopa do Mercado ( como se chamava mesmo???), depois dos programas e da badalação na noite gelada!
Ui,ui...bom tempo o da mocidade!Beijocas,
VV
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